Ultimamente tenho visto
discussões acaloradas entre bailarinas e profissionais da dança do ventre,
algumas condenando a inserção do ballet clássico na dança do ventre, outras dizendo
que o acessório x ou y está sendo utilizado de forma errada, outras reclamando
que não existe mais dança do ventre raiz. Hoje em dia temos de tudo no universo
da dança do ventre, existem as fusões, a utilização de diversos acessórios que
nem sempre foram utilizados na dança do ventre desde véus até leques com penas,
o ballet já está na dança do ventre faz tempo, não tem mais como dançar sem a
realização de pelo menos um girinho ou um arabesque, e por mais que você seja
contra, uma vez na vida você dançará com uma música não árabe.
E fiquei aqui me
questionando, o que seria o certo e o errado da dança do ventre. Li a uns
tempos atrás um texto excelente do Amir Thaleb onde ele explica o estilo
argentino (texto completo aqui: https://www.facebook.com/photo.php?fbid=10153115721167188&set=a.46129862187.55836.589402187&type=1&fref=nf&pnref=story)
e ele fala que toda a forma que cruza as fronteiras de sua origem, inevitavelmente,
passa por mudanças. E que este é um processo normal, por exemplo, quando você
come em um restaurante mexicano em qualquer lugar do mundo não terá o mesmo
gosto do que em um restaurante no México, mais ortodoxo e tradicionalista, porém
existem pessoas que gostam dessa transformação porque talvez o sabor nativo (original)
seja estranho ao seu paladar.
É fato que a dança se
transformou, recebeu influência de outras danças, desde o jazz até dança
moderna, para torná-la mais atraente ao público leigo, véus de todos os tipos
foram introduzidos, o véu wings por exemplo, é uma invenção atual (https://bellydancenajla.wordpress.com/2011/05/23/belly-dance-prop-tacular-isis-wings/).
Há tantos estilos
diferentes em diferentes partes do mundo: o estilo egípcio, libanês, iraquiano,
grego, turco, argentino, russo, americano, etc. E qual deles é o certo? Hoje não
conseguimos dizer qual é o estilo certo, acredito que a bailarina vai
construindo o seu estilo, estudando diversas bailarinas, tendo aula com
diferentes profissionais para finalmente encontrar o seu estilo: uma mistura de
vários estilos dos quais se identifica e que combinam com sua personalidade.
Mesmo o folclore que
possui regras mais rígidas (ritmo próprio, figurino característico, passos
tradicionais), e que mudou pouco com o passar do tempo, sofreu influências, por
exemplo, nas releituras do Mahmoud Reda.
Não existe mais a dança
do ventre raiz, o que vejo hoje são bailarinas que tentam fazer uma dança mais
clean (como era antigamente) preservando os passos tradicionais da dança do
ventre, tais como oitos, básicos egípcios e ondulações e resgatam bailarinas
tradicionais como Samia Gamal, Naima Akef, Taheya Carioca, etc. Eu mesma falava
por aí que eu era uma bailarina conservadora por gostar mais do estilo ‘raiz’,
mas depois conclui que estava sendo contraditória, pois minha bailarina
favorita atualmente é a ucraniana Dariya Mitskevich, que tem toda uma técnica
própria, com muita inserção de ballet e dança de salão.
Temos que ficar atentas
antes de criticarmos uma outra bailarina, temos que tomar cuidado ao dizer que
a Fulana está dançando errado, ainda mais se ela estiver dançando uma música
moderna ou utilizando acessórios modernos. Concordo que ainda existem regras, e
ainda bem que existem, senão a dança do ventre perderia toda a sua essência, espera-se
que uma bailarina que tenha estudado bastante, quando for dançar bastão utilize
o ritmo saidi ou quando for dançar um khaleege utilize o ritmo soudi. Um oito
sempre será um oito, um básico egípcio sempre será um básico egípcio, não tem o
que inventar, são imutáveis.
E temos que tomar cuidado para
não descaracterizarmos a dança do ventre, pois dado que hoje temos essa gama de
inserções de outras danças, ritmos e acessórios, é muito fácil nos perdermos no
meio disso tudo. Vejo danças com muito malabarismo, muita utilização de
acessórios e quase nenhuma dança do ventre.
Por isso que temos que
estudar sempre, pesquisar muito, tentar diferenciar o que é tradicional e o que
não é, buscarmos as origens. É normal se sentir confusa, nem sempre é claro o
que é tradicional ou não, e que bom que isso acontece, pois significa que
estamos assimilando e questionando e aí está o verdadeiro aprendizado. Não sou contra as inovações, sou a favor de
fazer a inovação com consciência que é uma inovação, e sempre deixar claro isso
para o seu público e para suas alunas.